quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Capitulo 1 - A viagem - Parte 3

Quando finalmente decidi tentar a minha sorte (pior não podia ficar, pensava eu!), o telemóvel dela tocou! Fui salvo pelo gongo como se costuma dizer.
Achei que a rapariga (digo "rapariga" porque assim pela aparência devia ter a mesma idade que eu) precisava de alguma privacidade para falar ao telemóvel, então tirei uma sandes e um sumo de dentro da mochila, deixei-a em cima do banco e levantei-me. Fui ate perto de um placar que tinha um mapa da rede de comboios a meia dúzia de metros de distância do banco. Enquanto olhava atentamente para o mapa, decidi começar a comer a sandes que tinha comprado quando cheguei à estação. Sandes mista e sumo de maçã para acompanhar. Até não estava má a sandes, embora o queijo tivesse um sabor um nada estranho. Talvez fosse um queijo diferente daqueles que estou habituado a comer, ignorei o sabor e comi.

Observei as redondezas do sítio onde me encontrava enquanto fingia estar a observar o mapa. A estação era bastante iluminada, não tinha tecto, só uns toldos para abrigar as pessoas nas 3 plataformas existentes. Cada plataforma servia 2 linhas, por isso, 6 comboios poderiam partir da estação em simultâneo. Apesar do céu estar ainda um pouco nublado, a iluminação artificial era muito boa. As paredes da estação eram todas em tijolo laranja-vermelho, mas aquele tijolo pequeno. Fez-me lembrar o estilo inglês por momentos.
Havia meia dúzia de lojas: Duas lojas de conveniência, 2 restaurantes, uma papelaria e uma florista, casas de banho, cabines telefónicas onde estavam 2 indivíduos com mau aspecto a falar ao telefone, uma maquina Multibanco onde se podia ver uma senhora com uma certa idade a reclamar com a máquina, bilheteiras sem ninguém na fila e uns quantos bancos e caixotes do lixo ao longo das plataformas. Achei piada à florista, estava muito fora do contexto. A própria decoração exterior da loja não tinha muito a ver com o estilo do resto da estação de comboios. A própria florista (pessoa que lá trabalhava) encontrava-se naquele momento à porta da loja a falar ao telemóvel com a maior das calmas olhando para os tipos da cabine e parecia que a conversa estava a correr bem pois ela ia sorrindo, não devia ter muito para fazer. Era uma rapariga nova mas com ar de quem passava uma certa fome.

Subitamente aconteceu uma daquelas coisas que realmente me fez acreditar na ideia que tive de manha quando me deparei com a chuva. Que esta viagem ia ser algo complicada.
Conforme me virei de costas para o placar, dando uma volta de 180º, vejo uns quantos polícias com cães a entrar por uma das 4 portas da estação, correndo em direcção ás bilheteiras.
Fiquei apreensivo e surpreendido tal como a maior parte das pessoas na estação. Conseguia-se deduzir isso pelas expressões na cara daqueles que se aperceberam do aparato.
O Relógio XL em pedra que estava pendurado na estação marcava 10h07m.
"Senhores e Senhoras, todos os comboios foram cancelados até novas instruções. Queiram abandonar as instalações, com calma e ordenadamente. Obrigado" – Ouviu-se alguns segundos depois por toda a estação através dos altifalantes.
"Ora bolas, lá se vai o meu comboio!” – Pensei.

Entretanto houve uma invasão de polícias e seguranças pela estação a dentro, tudo muito rápido, para tentar tirar o povo de dentro da estação.
Quando olhei novamente para o banco, nem miuda, nem a minha mochila!
De repente senti uma mão nas minhas costas, quando me virei era um funcionário da estação.
"Peço desculpa mas temos de abandonar o recinto, o mais breve possível." - Disse ele calmamente.
"Mas o que é que se passa?" – Perguntei curioso.
"Não posso divulgar, acompanhe-me até à porta por favor!" – Respondeu ele sem expressão.
Mandei a garrafa de sumo para o lixo que estava mesmo ao lado e fui então acompanhado pelo senhor funcionário até uma das portas. Estava um caos do lado de fora da estação. Dezenas, senão um pouco mais, de pessoas com malas, aos gritos a reclamar, outros a tentar perceber o que se passava espreitando para dentro da estação e outros simplesmente a tentarem afastar-se do meio da confusão indo em direcção à paragem de autocarro mais próxima. A polícia com grande dificuldade tentava acalmar os ânimos e mandar as pessoas para fora dali.

Quando cheguei cá fora tive um breve momento para pensar e apercebi-me da gravidade da situação. "Estou aqui com o telemóvel num bolso e bilhete de comboio no outro!" – Pensei tentando respirar ao mesmo tempo para não entrar em pânico. Era constantemente empurrado, era quase pior que ir a um concerto de rock!
Num acto lúcido, decidi furar a multidão no sentido oposto à da estação, atravessar a estrada e do outro lado então, olhar para o povo que ali estava para tentar ver se encontrava a minha ladra preferida de olhos verdes. Não era tarefa fácil.

"Olha, esta mochila não é tua?" – disse uma voz que me lembrava de ter ouvido não há muito tempo. Quando olhei, era ela!
"Sim, e porque é que não deixaste a mala no banco onde ela estava? ou por outra, se a roubaste, por que é que me a estás a devolver?" – Estava confuso e sem saber o que pensar.
"Calma, eu não roubei. Um polícia perguntou se era minha, e provavelmente se não dissesse que sim, ia ser mais difícil para ti de reavê-la pois eles olharam para a mochila com um ar suspeito." - Nem ela tinha acabado de falar a palavra "suspeito" e tudo fez sentido.
Ameaça de bomba!
Apressei-me a tirar a máquina fotográfica de dentro da mochila, ignorando completamente que ela continuava ali.
"Que horas eram quando recebeste a chamada?" – Perguntei-lhe enquanto tirava as primeiras fotos à estação e à multidão que ali estava.
"Qual chamada?"
"A que recebeste quando te sentaste no banco ao meu lado!" – Perguntava eu rapidamente tentando tirar fotos e não me esquecer do meu raciocínio que estava a ter ao mesmo tempo que respondia à pergunta dela.
"Não sei, porque?"
"Vê nos registos do telemóvel, rápido!"
"Mas porque?" – Perguntou ela enquanto começava a tirar o telemóvel de dentro do saco desportivo.
"Mostra-me sff! Segura-me na máquina." - Quase lhe tirei o telemóvel de uma mão enquanto lhe passei a máquina fotográfica para a outra e rapidamente meti a minha mão ao bolso para tirar o meu telemóvel.
"Lista telefónica... R, R, R, Redacção! Chamar!" – Estava ansioso, tinha as primeiras fotos do acontecimento, pensei. Queria ver quanto me daria um jornal local, para o qual eu trabalhava como freelancer, pelas fotos.
"’Tô, colega, pode me passar ao Eduardo Esteves, por favor?" – O Eduardo era o cromo que me fazia as propostas miseráveis pelas fotos e que cedia sempre acabando por subir um pouco o preço das fotos após algumas negociações. - "Sim Eduardo, bom dia, daqui fala o Seth! Tou na estação de comboios e houve uma ameaça de bomba, tenho as primeiras fotos acabadas de tirar. Não queres mandar cá ninguém para recolher mais informações e talvez entrevistar as autoridades?" – Apesar de não ser nada demais, eu esforçava-me ao máximo para conseguir uma oportunidade para fazer parte da equipa do jornal. Não gostei muito da resposta do Eduardo, disse que ia enviar a jornalista e o fotógrafo assim que possível visto ser fim-de-semana eles estavam de folga. Só não percebi porque é que ele tinha que mandar o fotógrafo. Não estava lá eu?
Entretanto vi que a chamada recebida no telemóvel da outra tinha sido ás 9h58m. Devolvi o telemóvel e agradeci.
"Tens aqui uma máquina muito interessante. És fotografo?" – Perguntou-me ela.
"Sim, E já agora o teu nome é?"
"Vanessa! Tu és o Seth, já percebi."
"Pois. Obrigado por me teres salvo a mala, foi muito inteligente e simpático da tua parte fazeres isso por alguém que não conheces." - Disse eu tentando ser simpático visto ela ter me poupado algum trabalho com a policia.
"Não foi nada demais, reparei que a mochila era tua e aconteceu tudo tão rápido que percebi que nem te apercebeste que a polícia ficou intrigada com a tua mochila ali sozinha na outra ponta do banco."
"Ok. Obrigado de qualquer maneira."
"De nada. Já agora, para que é que querias saber a que horas eu recebi a chamada?"
"Nada de mais, tenho uma pista em mente caso se confirme que foi ameaça de bomba."
"Então, conta-me!"
"Não é nada, devem ser devaneios meus. Tenho de me ir embora." - Eu não queria dizer o que pensava, não fosse ela rir, ou então não fosse ela contar algo á polícia e ficar com a fama para ela.
"E os teus colegas do jornal? não vais esperar por eles?"
"Não. 1º Eles não são meus colegas e 2º se o outro vai mandar um fotógrafo, eu já não faço aqui nada. Tenho de ir andando. Adeus e obrigado." – Disse-lhe já depois de ter metido a máquina na mochila e a mochila ás costas. Concentrando-me novamente na minha viagem, tinha de ir à estação de comboios mais próxima e esperar que houvesse maneira de seguir a minha viagem sem muitos mais atrasos.
"Ta, xau." - Respondeu ela já enquanto eu me afastava.

10h52m e eu já estava em outra estação à espera. Ainda tinha que trocar novamente de comboio pois como a linha era outra, este comboio não ia para a cidade que eu queria.
Com a situação toda que se passou até me tinha esquecido que tinha sonhado com a outra rapariga e nem lhe cheguei a falar nisso. Agora era tarde de mais, ela tinha ficado para trás.
O meu telemóvel tocou. Chamada de um número que eu não conhecia.
“’Tô, quem fala?” – Confesso que não sou muito simpático a atender telefonemas. – “ Vanessa? Como arranjaste o meu número?”

terça-feira, 4 de setembro de 2007

Capitulo 1 - A viagem - Parte 2

Entretanto tinha parado de chover, mas nem por isso parou de estar frio e eu ali armado em herói de manga curta. "É psicológico, o frio é psicológico!" – pensava eu enquanto folheava as primeiras páginas do livro que comprara. Reparei que o livro tinha 222 Páginas (Bolas, grande paranóia! 2 2 2 2 2 2 2...). 9h e o amigo sol nada, não tinha aparecido ainda.

Meia hora à espera e o livro não me estava a ajudar a passar o tempo, pois ainda tinha sono e volta não volta fechava o olho, esquecendo-me do parágrafo anterior que tinha lido há 1 minuto atrás. Acho que uma das vezes quase cheguei a adormecer!
Foi então que me lembrei de andar um pouco para ver se acordava. Já com as calças quase nada molhadas da chuva e do chocolate quente, decidi ir á casa de banho e aproveitava, não fosse dar vontade no comboio!



Quando voltei, vi alguém sentado no banco onde eu já tinha estado.
"hum... deve haver espaço para os 2, apesar da minha mochila!" - pensei eu enquanto me aproximava e começava realmente a ver quem estava ali sentado.
"NAO ACREDITO!!!" - Conforme me fui aproximando e a silhueta da pessoa foi tomando forma e cor, apercebi-me que conhecia a pessoa de algum lado. Olhos verdes, cabelo negro e liso... - "É ELA, A RAPARIGA DO SONHO!" - lembrei-me. (Para quem não se lembra, ler o primeiro parágrafo da historia). - "E agora o que faço? ela não me conhece! mas eu conheço-a do sonho!...como é possível?" - a minha mente latejava mil perguntas por segundo, o coração também tinha disparado. Estava nervoso. - "Será que devo meter conversa? Se lhe digo que sonhei com ela, vai pensar que é frase de engate!" - Encontrava-me numa situação complicada. Por um lado queria contar-lhe que tinha sonhado com ela e perceber se poderia ter algo para me dizer mas por outro lado não me lembrava o que ela me tinha dito no sonho, aliás, penso que acordei mesmo na altura em que ela ia começar a falar! Que cena mais incómoda.

O tempo passava, sentia os segundos a avançarem e eu ali sem quebrar o gelo. Ela com uns fones nos ouvidos também não tornava a minha vida fácil para meter conversa. Devia ser atleta, trazia um saco desportivo. Estava a roer as unhas, o que eu não achei muito bom, mas fazer o quê?! Eu próprio também sofria do mesmo vício.

Quando finalmente decidi tentar a minha sorte (pior não podia ficar, pensava eu!), o telemóvel dela tocou! Fui salvo pelo gongo como se costuma dizer...

sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Capitulo 1 - A viagem - Parte 1

Acordei sobressaltado, estava a ter um daqueles sonhos com alguém que nunca vi (e talvez nunca venha a ver), o episodio típico em que uma pessoa surge sabe-se lá de onde e te sussurra uma previsão de algo que ela sabe e tu ainda não.
7h41m.
Bela hora para acordar mas pelos vistos fui o único porque sol, nem vê-lo.

Sentei-me na cama a pensar que tinha realmente de abrir os olhos e tentar encontrar o caminho para a casa de banho. Ainda tinha uma longa caminhada, talvez uns 3metros, até chegar lá. Uma vez de pé e após todo aquele percurso extremamente longo e perigoso até ao lavatório, observava com um olho meio aberto e o outro mais ou menos fechado, o meu reflexo no espelho. O pensamento era sempre o mesmo todos os dias... "tenho tanto sono, é hoje que me deito mais cedo! e que tal se fosse já?". Decidi despachar-me.

Breve apresentação da minha pessoa:

Nome: Seth Meh Phri
Idade: 25
Aspecto: cabelo mais ou menos curto, loiro, alto, massa corporal de acordo com a altura. Uso Óculos.
Estilo de musica preferido: hOuse
Cidade natal: LisbOnyardz
Coisa que não suporta: pessoas que opinam sem perceber do assunto.
Profissão: fotografo
Pior defeito: egoísta por natureza
Maior vicio: roer as unhas
Passatempo preferido: dormir
Melhor virtude: ...(duvido que tenha!)
Coisa mais louca que fez ate hoje: saltou de um carro em andamento e só partiu um pé!
Outra info útil: talvez sofra de alguma lesão cerebral de nascença. Pensa que é extraterrestre.

Lavado, vestido, e com os pés dentro dos ténis, apareci publicamente de mochila ás costas. Assim que meti o pé na rua e apanhei com a chuva na cabeça senti que se tratava de uma viagem diferente. Tinha vestido umas calças pretas e uma T-shirt vermelha (ficava muito bem mesmo, principalmente á chuva!).

A missão dos próximos 2 dias era ir ate uma pequena cidade a 250km para sul, fotografar alguns locais e alguma flora para um projecto que tinha de apresentar daí a uns dias na universidade.

Após a curta viagem de autocarro, cheguei á estação.
"Ena, tanta gente com tantas malas!...devem ir de viagem.".
Segundo dilema do dia (o primeiro foi acordar, ou ficar a dormir!), que comboio escolher. Havia duas rotas de comboios que passavam pela cidade para onde queria ir. Uma delas era mais cara, mais rápida mas menos frequente, a outra era mais lenta, mais barata, mais frequente e mais susceptível a falhas no serviço pois com frequência os comboios atrasavam ou eram retidos em determinadas estações por "falhas técnicas".
Optei pela mais cara. 2horas de espera até à partida. Mas a hora de chegada era a mesma do comboio que acabara de perder.



Decidi dar uma volta pelas lojas da estação para comprar algo para comer, tinha-me esquecido de comer em casa, com a ânsia de partir para sul.

Acabei por comprar um livro chamado "nem imaginas onde te foste meter!" por gostar do título. Contava a história de 2 jovens de 22anos que fizeram um inter-rail de 2 meses pela Europa em 2002 partindo de Áustria a 2 de Fevereiro (2jovens,22anos,2meses,2002,2Fev...não são "2" a mais?). Comprei também um chocolate quente com extra-açucar que acabei por entornar um pouco nas calças e outro pouco no banco quando me sentei à espera do comboio.

Entretanto tinha parado de chover...